terça-feira, 20 de novembro de 2012

Trabalhando a cultura africana nas diversas disciplinas


Geografia
A África não é um país, e sim um continente
Essa afirmação pode parecer absurda, mas não é. "Há uma tendência em falar da África como se todos que ali vivem tivessem os mesmos hábitos e tradições", diz Rafael Sânzio Araújo dos Anjos, coordenador do Centro de Cartografia Aplicada e Informação Geográfica da UnB. Ele sugere que o professor localize em mapas os diversos povos que vieram para o Brasil e as riquezas de cada região, principalmente as minas de ouro e diamantes, para a turma entender os motivos da exploração.
Ao falar sobre os diversos povos, é possível destacar as contribuições de cada um para a economia do Brasil Colônia. "Eles trouxeram para cá a melhor tecnologia dos trópicos", informa Rafael. Tanto que os donos das terras encomendavam aos mercadores mão-de-obra especializada para a atividade de seus domínios. Os alunos da 4ª série da Escola Estadual Luigino Burigotto, em Limeira (SP), ficaram espantados ao saber que a enxada, o arado e técnicas de irrigação vieram para o Brasil com os negros. A visita à Fazenda Ibicaba, do início do século 19, ilustrou esse capítulo da aula de Geografia, onde eles conheceram a casa-grande e a senzala construídas pelos negros escravizados.
Atualidades
Problemas existem em todo o mundo
Miséria, epidemias e guerras civis existem hoje nos diversos países da África. Mas também estão presentes em outros lugares. Elaine Lavezzo, professora de Cultura Internacional da Escola Internacional de Alphaville, em Barueri, município da Grande São Paulo, trabalha um continente por ano com os alunos de 7a e 8a séries. Usando notícias de jornal e livros, ela discutiu com as turmas as guerras civis em Angola e em Ruanda, a fome e a epidemia de Aids. Os alunos do Ensino Médio trabalharam com jovens de baixa renda da comunidade de Santa Terezinha, em Carapicuíba, município vizinho. Reunidos uma vez por semana, eles pesquisaram problemas comuns do Brasil e dos povos africanos e produziram um programa de rádio, em português e em inglês, que organizações não-governamentais usam em Moçambique e em Nairóbi. Ela contou com a colaboração do professor de Inglês da escola, Bruce Kevin Mack, que falou sobre a sua infância de afro-descendente em Washington, capital dos Estados Unidos, e contou curiosidades de seus antepassados.
História
A África já existia antes dos europeus
O professor do Ensino Médio Jorge Euzébio Assumpção, do Colégio Estadual Presidente Arthur da Costa e Silva, em Porto Alegre, faz questão de mostrar como o continente africano era dividido em reinos antes da chegada dos europeus (veja infográfico animado). Livros, internet e textos produzidos pelo professor são fonte para os estudantes perceberem a estrutura social e política dos diversos povos. O reino do Congo, por exemplo, era dividido em aldeias familiares, distritos e províncias e todos os governadores eram conselheiros do rei. No império de Gana, os monarcas se reuniam todos os dias com os súditos para papear, ouvir reclamações e tomar decisões. Essas informações são comparadas com o modo de vida do negro no nosso país, na época da escravidão, nos quilombos e nos dias de hoje.
"A tradição oral é forte nas culturas africanas, mas os povos também sabiam ler, escrever e viviam em cidades desenvolvidas", destaca Assumpção. Baseados em relatos, os alunos construíram a maquete da cidade universitária de Tumbuctu, que começou a se desenvolver a partir do ano 12.
Ciências naturais
Somos todos africanos
Há 7 milhões de anos houve a separação entre as linhagens do macaco e do que viria a ser o homem mais tarde. Os fósseis mais antigos de nossos ancestrais foram encontrados no Vale da Grande Fenda, formação que atravessa a Etiópia, o Quênia e a Tanzânia. Milhões de anos depois, o Homo erectus teria partido dessa região para povoar a Ásia e a Europa, onde se transformou em homem de Neanderthal. Os que continuaram na África evoluíram para a espécie sapiens, que mais uma vez migrou, dizimando ou substituindo os neandertais e os hominídeos asiáticos. E assim o planeta foi povoado.
Douglas Verrangia, biólogo e pesquisador do Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros da Universidade Federal de São Carlos, ressalta a importância de o professor mencionar isso ao abordar a evolução das espécies, esclarecendo que biologicamente todos os seres humanos são parecidos e que as pequenas diferenças físicas não interferem na capacidade intelectual: "Isso vai ajudar o aluno a desmontar o falso embasamento científico que subdividiu a humanidade em raças, no século 19, idéias que perduram até hoje".
Gislaine Mara Piran, professora de Ciências e também coordenadora pedagógica da Escola Estadual Luigino Burigotto, inclui essa discussão nas aulas para as turmas de 5ª a 8ª série durante o estudo do corpo humano e da genética: "Deixo claro que alguns povos têm mais melanina na pele em conseqüência da adaptação ao ambiente em que viviam". Em história das Ciências, você pode citar as contribuições dos povos africanos para a medicina e outras áreas como mostra a linha do tempo das páginas anteriores.
Matemática
Simetria, geometria e cálculo
Na Escola Municipal Arthur de Sales, em Salvador, o projeto África na Sala de Aula é interdisciplinar e faz parte do planejamento. Ao conhecer a cultura egípcia, os alunos de 2ª série da professora Nilce Maria Dantas da Gama estudam as pirâmides e os triângulos. Olhando gravuras que retratam a construção dos monumentos, eles tentam estimar a quantidade de pessoas que trabalharam na obra e de tijolos usados.
A turma da professora Carla Ferreiro de Sena estudou simetria usando alguns símbolos egípcios: "Esse conceito será importante depois, no estudo do corpo humano". Ela mostrou as figuras e pediu que todos as interpretassem. Conhecendo os diferentes significados — como pureza espiritual (unsum), solidez e perseverança (wawa aba), precisão e habilidade (nkyimu) —, eles perceberam a importância de ler imagens. No final, a turma elegeu valores como amizade, respeito e solidariedade — mais próximos deles — e criaram símbolos simétricos para eles.
Língua estrangeira
Reggae e biografias
Algumas escolas de comunidades quilombolas prevêem no planejamento atividades para resgatar a língua de seus ancestrais. Mas, mesmo quando o idioma a ser aprendido é o inglês ou o espanhol, é possível inserir a cultura africana e afro-descendente. Cláudia Alexandra Santos, professora de 5ª a 8ª série do Colégio Estadual Marquês de Maricá, em Salvador, leva para suas turmas letras de músicas do afro-descendente jamaicano Bob Marley e de outros cantores negros e textos em inglês sobre a vida de lideranças como os americanos Malcom X e Martin Luther King. Para Vilma Reis, coordenadora executiva do Centro de Estudos Afro-Orientais da Universidade Federal da Bahia, a introdução da cultura negra no ensino de língua estrangeira deixa o aprendizado mais próximo dos afro-descendentes.
Língua portuguesa
Palavras, lendas e heróis
Para mostrar a influência dos falares africanos no Brasil, você pode usar as palavras de origem banta destacadas nesta reportagem, apenas um tiquinho em centenas já incorporadas ao nosso vocabulário. Yeda Pessoa de Castro, professora da Faculdade de Educação da Universidade Federal da Bahia, sugere ainda que você leve para sala de aula lendas africanas e histórias que tratem de diversidade. A professora Zuleica Maria Bispo, da Escola Municipal de Educação Básica Antonio Stella Moruzzi, em São Carlos (SP), usa livros como Menina Bonita do Laço de Fita, de Ana Maria Machado, O Pássaro-da-Chuva, de Kersti Chaplet, e o gibi Zumbi dos Palmares (produzido em 2001 pela Editora Lake é distribuído gratuitamente) para atividades de leitura e escrita. Familiares dos alunos afro-descendentes podem ser convidados para contar histórias de sua vida, informações que serão transformadas em texto.
Artes
Na dança, nas máscaras e nos desenhos
A Escola Estadual Geraldo Melo dos Santos, em Maceió, usa elementos da cultura dos povos africanos em todas as séries: a professora Moeme Maria da Silva trabalha conceitos de arte abstrata e geometrismo com as 6as; danças, mitos e adereços com as 7ªs; e máscaras com as 8ªs, relacionando essas produções às manifestações artísticas do continente europeu. Para Ana Lúcia Lopes, coordenadora do Núcleo de Educação do Museu Afro-Brasil, em São Paulo, o desafio é não resvalar no preconceito nem cair no encantamento do exótico: "Como a cultura dos povos africanos é pouco conhecida para nós, fica fácil se deslumbrar com o diferente e esquecer de dar valor às culturas africanas em sua essência".
Educação física
Vamos jogar iitop ou mbube-mbube?
Para a disciplina que se dedica à educação do corpo, brincadeiras que privilegiam as competições em equipe. Antônio José dos Santos, também da escola Antonio Stella Moruzzi, há um ano usa o iitop, o mbube-mbube (ou o tigre e o impala) e a mamba, e jogos como o yote e a mancala. Ele inicia contando a história do jogo e os valores da cultura africana presentes em cada um. Veja como construir o kalah, versão do mancala e conheça as regras dos outros jogos.

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